Sob o olhar atento do Monumento à Liberdade, em pleno coração de Caxias do Sul (RS), estreia neste sábado, 22 de outubro, às 15h, o projeto Ver o Outro – As famílias senegalesas muçulmanas na Serra Gaúcha. Uma exposição fotográfica assinada por Franciele Oliveira e um bate-papo trazem aos espaços públicos da cidade uma narrativa sensibilizadora das imigrações contemporâneas e de sujeitos por meio da arte.
O Ver o Outro – As famílias senegalesas muçulmanas na Serra Gaúcha é um projeto realizado pelo Movi – Saberes e Fazeres Migrantes e financiado via Pró-cultura RS, do governo do Estado do Rio Grande do Sul. O projeto se classificou em primeiro lugar na região e em quarto no estado.
A Praça Dante Alighieri é o primeiro espaço público de Caxias do Sul a receber a exposição. Produtora do projeto ao lado do senegalês Demba Sokhna, Franciele explica que o Ver o Outro reúne um grupo de pessoas de diversos lugares do Sul Global que buscam por dias melhores e por uma sociedade mais justa e humana.
“Estamos trabalhando juntos em prol da cultura, da arte e da ressignificação da história de Caxias do Sul. A exposição nasce de demandas sociais, de olhares e vivências na cidade de Caxias sobre os movimentos que a constituem. Há muitos migrantes e pessoas em deslocamento que não se percebem neste lugar. Os imigrantes internacionais acabam por se distinguir em função das diferenças culturais e da língua, mas Caxias recebe diariamente migrantes de todo o Brasil”, explica.
Demba reforça que esse movimento não está restrito ao nosso País, logicamente, e ressalta como é visto por aqui. “As imigrações hoje em dia são algo natural, normal. Infelizmente, no Brasil assusta, mas pessoas estão indo em tudo que é lugar do mundo para buscar oportunidades, trabalho, conhecimento, recursos, culturas”, ressalta. Para ele, ao se olhar de verdade para o outro, ao vê-lo realmente, percebe-se o quanto de coisas extraordinárias ele tem e o quanto pode ser importante para o nosso dia a dia. “Passamos pelo outro sem perceber o que ele tem de importante para nós”, completa.
Para que essa visão realmente se concretize, as fotos estarão expostas em seis totens espalhados ao redor do Monumento à Liberdade, na Praça Dante. Conforme a historiadora Geovana Erlo, responsável pela expografia, com a intenção de sugerir que o outro seja visto de forma integrativa, os suportes para as fotografias foram criados de forma a possibilitar interação do público. “O elemento tem relação com três conceitos que norteiam a exposição: o ver, o viver e o mover. A escolha do triângulo representa a noção da família, pois é a forma geométrica mais utilizada pela sua rigidez e sustentação”, explica. A forma geométrica aparece também na disposição dos seis painéis, que formam um outro triângulo na Praça Dante, abraçando o monumento.
Cinco totens representarão pontos-chave para pensar a presença dos senegaleses: a família senegalesa em deslocamento, as mulheres, os muçulmanos, as crianças e a relação com Caxias do Sul. A sexta estrutura será a abertura e o encerramento da exposição, oferecerá interatividade e receberá o sentimento de quem passar por lá, for tocado e quiser contribuir. Lambes espalhados pelos arredores possibilitarão que a exposição se espalhe por outros pontos da cidade, e o catálogo disponibilizado on line em movisaberesefazeresmigrantes.com ainda tem ilustrações e informações complementares ao material exposto na rua.
Em um dos trechos, há a seguinte informação: ”As famílias senegalesas são muçulmanas – isso, por si só, dá a elas um valor sagrado. Aqui, estamos nos referindo a uma família nuclear, composta por esposa, marido e filhos. Essas famílias não se vinculam apenas pelos laços biológicos, mas também pelas experiências e situações pelas quais passaram. Por exemplo, pelo acolhimento e pelos vínculos construídos, as primas tratam-se como irmãs e pais e mães brasileiros ganham filhos senegaleses já adultos”.
Um bate-papo com o tema “O lugar dos imigrantes em Caxias do Sul”, junto à exposição, completa a programação dessa primeira etapa (em novembro, a mostra vai para a Praça do Trem). O convidados são o imigrante senegalês Cher Cheikh, a vereadora e deputada federal eleita Denise Pessôa, a assistente social do Centro de Atendimento ao Migrante, Geraldine Monteiro, e a profissional de marketing e presidente do Vivacidade, Madeline Juber.
“São anos de pesquisas, trocas e ciência nesse processo de construção da exposição e o entendimento da urgência de falar sobre as temáticas que passam pela experiência das imigrações em espaços públicos. É a nossa cidade, precisamos cuidar dela e das pessoas que a escolheram para viver”. No catálogo, Franciele conta um pouco do bastidor que encontrou durante o trabalho. “No processo de deslocamento do núcleo familiar há, também, muitas crianças que não migraram com suas mães. Em conversas informais, houve discussões acerca da dificuldade da obtenção de autorização de ingresso no Brasil para as mulheres e crianças, algo que problematizou o processo de reunificação familiar desses grupos”.
E como as diferenças se igualam? Ela responde: “É enriquecedora a troca oferecida pela dinâmica migratória, recebemos recentemente muitos refugiados, é importante acolhermos e compartilharmos o que todos nós temos: a nossa humanidade”.